Podemos nós, freelancers, ficar doentes?
Começo a achar que isto podia mesmo virar uma rubrica:
“Podemos nós, freelancers, fazer ou não fazer…?”
Já falámos das férias (tema sensível), e agora vem outro igualmente arriscado: o que acontece quando os freelancers ficam doentes.
Ser freelancer é liberdade — até ao dia em que o corpo se lembra de existir
Ser freelancer é lindo — pelo menos, visto de fora.
Ahhh, ser freelancer… não tens chefe, fazes o teu horário, trabalhas de onde quiseres, és o dono do teu tempo.
Tudo ótimo — até alguém se lembrar de te perguntar:
👉 “Mas e se ficares doente?”
Pois. Aí é que está o truque.
Porque sim, ser freelancer tem liberdade, mas também tem ausências:
não há subsídio de férias, nem de Natal, nem colegas que cubram o teu lugar.
E quando o corpo decide que é hora de parar… o problema é que o negócio não para contigo.
E é exatamente aqui que muitos freelancers que ficam doentes percebem o outro lado da moeda — o da responsabilidade total.
Quando os freelancers ficam doentes, o mundo não pára (mas devia)
Quando és freelancer e ficas doente, o problema não é só a febre.
É o email que ficou por responder, o projeto que tinha de ser entregue ontem e aquela sensação agridoce de “adorava poder deitar-me no sofá, mas o sofá não paga contas.”
E é aqui que entra a parte que ninguém gosta muito de dizer em voz alta:
nós, freelancers, não podemos mesmo ficar doentes.
Ou, vá, podemos… mas dá jeito que passe depressa.
A dupla versão do freelancer doente: o que aguenta e o que aprende
Durante os últimos anos, já passei pelas duas versões:
a do “aguentar o barco” e a do “pedir ajuda”.
Na primeira, o corpo deu sinais, eu ignorei (clássico), e continuei a tentar fazer tudo — emails, reuniões, entregas e provavelmente um ou outro design em cima da manta com 38,5º de febre.
Na segunda, aprendi. Deleguei o que pude, avisei quem tinha de avisar e aceitei que o mundo não ia parar porque eu parei dois dias.
Mas mesmo assim, é difícil.
Porque há sempre aquela vozinha de culpa:
“Se eu parar, perco o ritmo.”
“Se eu parar, o cliente vai achar que desapareci.”
“Se eu parar, o mundo inteiro vai avançar sem mim.”
Spoiler: não vai.
Liberdade ou dependência? A verdadeira realidade dos freelancers
A vida de freelancer é uma dança constante entre o “sou livre” e o “sou refém”.
Enquanto nas empresas existe sempre alguém para segurar as pontas, nós somos empresa, equipa e RH tudo em um.
E quando a saúde falha, percebemos rapidamente que essa liberdade que tanto prezamos tem um preço — pago em exaustão, ansiedade e arrependimento por não termos parado antes.
Como já falei no artigo sobre freelancers e férias, a grande ironia é esta: lutamos por liberdade, mas temos medo de a usar.
O que fazer quando os freelancers ficam doentes
Há estratégias simples (e realistas) que ajudam a lidar com esta realidade:
- Ter um fundo de maneio — aquele “colchão” que permite parar uns dias sem pânico.
- Planear com antecedência e definir prazos realistas.
- Criar sistemas automáticos que mantêm o negócio a funcionar.
- E, sempre que possível, construir uma rede de colegas de confiança para ajudar em situações de emergência.
Porque, no fim, os freelancers ficar doentes não é uma falha de gestão.
É uma inevitabilidade humana.
O verdadeiro sucesso é parar — sem culpa
Ser freelancer é ótimo. Mas também é duro.
E talvez o verdadeiro sucesso esteja em chegar ao ponto em que conseguimos estar doentes sem sentir culpa.
Em aceitar que, se quisermos continuar a fazer bem o que fazemos, também precisamos de tempo para não fazer nada.
No fundo, é como nas férias (lembras-te?):
O problema não é querer parar.
É conseguir fazê-lo sem sentir que o mundo vai desmoronar.
E por mais surpreendente que pareça…
na semana passada estive dois dias na cama.
E o mundo continuou a girar.
Quem diria?